Com experiência no diagnóstico de neuralgia do trigêmeo, neurocirurgião Marcelo Senna foi procurado há 7 anos por Carolina Arruda. Antes, ele tinha descoberto o mesmo problema no bisavô dela.
O médico que diagnosticou há 7 anos que Carolina Arruda sofre da ‘pior dor do mundo’ foi o neurocirurgião Marcelo Senna, que tem mais de 30 anos de experiência com a neuralgia do trigêmeo. Anos antes, Senna já tinha dado o mesmo diagnóstico para o bisavô da jovem moradora de Bambuí (MG).
“As dores decorrem de uma artéria que acaba se deslocando e comprimindo o nervo do trigêmeo que, na face, é o mais calibroso. As causas do que provoca essa compressão são desconhecidas, então, não há como falar de hereditariedade”, explicou o médico.
Senna foi procurado por Carolina, à época com 20 anos, quando ela já convivia com as dores há quatro anos e já tinha passado por vários médicos.
“A neuralgia do trigêmeo não aparece em um exame de imagem. Então, ouvir o histórico dela, as queixas e como os episódios de dor ocorriam foram fundamentais para fechar o diagnóstico, que na idade em que ela estava é extremante raro. A doença acomete principalmente adultos e idosos em uma faixa etária de 50 a 80 anos”, disse.
Após o diagnóstico, Carolina Arruda realizou vários tratamentos com outros médicos e cirurgias, como descompressão microvascular, rizotomia por balão e duas neurólises por fenolização, mas sem alívio que trouxesse qualidade de vida para ela.
Mas, embora os tratamentos sugeridos por outros profissionais não tenham surtido efeitos positivos na jovem, o neurocirurgião ressaltou que a maioria dos pacientes responde bem ao acompanhamento medicamentoso.
“Muitos pacientes apresentam respostas positivas aos tratamentos, mas é claro que cada indivíduo responde de forma única ao que é submetido”, enfatizou.
O relato de Carolina sobre a doença
Carolina Arruda mora em Bambuí, no Centro-Oeste de Minas Gerais, e é estudante de medicina veterinária. Casada há três anos e mãe de uma menina de 10, Carolina começou a sentir as dores aos 16 anos, quando estava grávida e se recuperava de dengue.
“A primeira dor veio quando estava sentada no sofá da casa da minha avó, tinha acabado de me recuperar de uma dengue. Era uma dor forte, fora do comum. Eu gritava e chorava. Tentei explicar o que era, mas não conseguia palavras porque nunca tinha sentido uma dor tão absurda. A princípio achei que seria uma dor de cabeça em decorrência da dengue”, relembrou.
Os episódios de dor se tornaram constantes, mas ficaram frequentes após o nascimento da filha. As dores contínuas atrapalhavam tanto a vida de Carolina que ela abriu mão da criação da bebê quando ela completou um ano. A menina, então, foi morar com os bisavós.
“Infelizmente eu não tinha a menor condição de cuidar da minha filha. Eram muitas crises, idas e vindas de hospitais, tratamentos, cirurgias”.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_59edd422c0c84a879bd37670ae4f538a/internal_photos/bs/2024/X/k/DzyKVhTpeb8PBtOBhzUw/medicina-veterinaria.png)
A dor e o desgaste de Carolina com a doença são tão intensos, que fizeram ela tomar a decisão para pôr fim ao sofrimento. Há poucos dias ela começou uma campanha na internet para conseguir recursos financeiros e ser submetida ao suicídio assistido na Suíça.
“Já pesquisei sobre tratamentos fora do país, mas são os mesmos que temos aqui. Não existe nada revolucionário fora do Brasil. A falta de conhecimento sobre a doença por parte dos médicos só piora a situação. Os especialistas e médicos de plantão muitas vezes não conhecem a doença e não sabem como tratar”.
A Suíça é um dos poucos no mundo onde a assistência médica para o suicídio é legal. Contudo, os pacientes precisam fornecer provas da condição médica, passar por avaliações psiquiátricas e demonstrar um desejo claro e consistente de pôr fim à vida.
As organizações que facilitam o suicídio assistido na Suíça oferecem apoio cuidadoso para garantir que a escolha do paciente seja respeitada, e que o processo seja conduzido com dignidade.
“Eu não aguento mais. A decisão de buscar a eutanásia foi tomada internamente há muito tempo. E, sim, eu penso em quem vai ficar, mas coloco na balança: as pessoas que me amam preferem lidar com meu sofrimento diário ou lidar com o sentimento da perda, sabendo que eu não estarei mais sofrendo? Não quero viver com dor o resto da vida”.
“Queria que refletissem com mais empatia. Tomar essa decisão não foi fácil e ela foi baseada em muitos tratamentos e experiências negativas, ouvindo de médicos que não tinham o que fazer. Peço um pouco mais de compaixão”, finalizou.
O que é a neuralgia do trigêmeo?
A neuralgia do trigêmeo, também conhecida como a “doença do suicídio”, e comparada a choques elétricos e até a facadas. O trigêmeo é um dos maiores nervos do corpo humano. Ele leva esse nome porque se divide em três ramos:
- o ramo oftálmico;
- o ramo maxilar, que acompanha o maxilar superior;
- o ramo mandibular, que acompanha a mandíbula ou maxilar inferior.
Ele é um nervo sensitivo, ou seja, que controla as sensações que se espalham pelo rosto. Permite, por exemplo, que as pessoas sintam o toque, uma picada e a dor no rosto.
A doença normalmente atinge um lado do rosto. Em casos mais raros, pode atingir os dois — como é o caso da estudante de veterinária.
Segundo os especialistas, a dor causada pela doença é uma das piores do mundo. Ela não é constante fora das crises, mas é disparada por alguns gatilhos que, na verdade, fazem parte das vida cotidiana como falar, mastigar, o toque durante a escovação ou barbear e até com a brisa do vento sobre o rosto.
A dor é incapacitante. Ou seja, impede que a pessoa consiga fazer atividades simples do dia a dia.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_59edd422c0c84a879bd37670ae4f538a/internal_photos/bs/2024/y/1/i35SUoRomyJh1AyE87Bg/thumbnail-image002-1-.png)
Fonte: Anna Lúcia Silva, g1 Centro-Oeste de Minas — Bambuí – 06/07/2024